Congresso da ANAFRE 2010
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NOVO RUMO PARA AS JUNTAS DE FREGUESIA

Ex.mo Sr. Presidente da ANAFRE - Associação Nacional de Freguesias

Caros Congressistas

Comunicação Social

Estar num Congresso destes para se discutir o papel das Juntas de Freguesias na sociedade, as suas competências e o que poderão elas ser no futuro, para melhor servirem as populações, é sem dúvida um momento importante e que deverá ser aproveitado. Todas as contribuições devem ser apresentadas, para que a discussão, possa servir de base para “reformar” a instituição Junta de Freguesia. E quando aqui refiro Junta de Freguesia não estou a confundir o Órgão Autárquico com o espaço físico, com denominação, delimitações, pessoas e tradições. Uma coisa é as Freguesias, outra coisa é as Juntas de Freguesia. As Freguesias existirão sempre, caso uma pessoa nela viva. Mas será que vivendo uma só pessoa se possa manter uma Junta? É esta a pergunta que deveremos fazer, ao mesmo tempo de uma outra questão: Actualmente, não existirão certas competências que estão a ser sobrepostas entre Juntas e Câmaras e outras em que há um vazio de intervenção? É preciso muita coragem, muita disponibilidade e pouco “bairrismo”, no sentido mais negativo do termo para se avançar noutro sentido. Só assim pensaremos em Portugal começando pela nossa rua, pela nossa terra.

 

Ex.mo Sr. Presidente da ANAFRE

Caros Congressistas

Em muitos casos, as Juntas de Freguesia vivem de mão estendida, à caridade dos executivos municipais ou sujeitos às suas retaliações. Isto porque praticamente não têm verba própria e a que dispõem é praticamente para gestão corrente. Só quando a imaginação, a ginástica política, a persistência, a amizade ou até a “cunha” partidária resultam, é que, ainda se vê alguma obra ao longo do mandato. É que obra a escassos meses de eleições, sempre vai havendo alguma para “iludir” o votante mais distraído. Mesmo assim e, no meio desta “agonia” em que estão por aí as freguesias, alguns presidentes conseguem ainda mostrar serviço. Outros (muitos), resignaram-se a passar atestados de residência e a mandar os funcionários limpar as valetas. Chegados a este estado, é necessária uma “revolução” ou uma reforma a sério, para que, assim como as câmaras não dependem em demasia do Governo Central, também as Juntas têm que se autonomizar mais, elas que são o elo mais próximo entre eleitores e eleitos. E esta discussão torna-se actual, não pela minha opinião neste Congresso, obviamente, mas porque autarcas mais experientes já tentaram colocar o “dedo na ferida”. António Costa, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, no seu discurso do 5 de Outubro de 2008, referiu que a autarquia a que preside está privada “pelo Estado de competências essenciais ao exercício das suas atribuições” e que “acumula competências que melhor seriam exercidas por freguesias de bairro”. Assim sendo, seria essencial que quem está mais por dentro deste tipo de problemas, pudesse elencar um conjunto de medidas para mudar este atrofiamento, ou se preferirem e, para citar alguém, esta “claustrofobia” em que estão mergulhadas as Juntas de Freguesia.

Falando em mudanças e, se alguém não tivesse faltado à palavra dada, neste momento já teríamos nova lei autárquica. Em 2009 as candidaturas às Câmaras teriam sido já mais ágeis e adequadas aos novos tempos. Em vez de duas listas (Câmara e Assembleia Municipal) passaria a existir só uma (Assembleia Municipal), tal qual desde sempre aconteceu na eleição dos autarcas das Juntas de Freguesia. Esta mudança retirava poder de voto aos presidentes de junta nas Assembleias Municipais? Sim, mas dava-lhes, no fundo, mais independência, o que seria benéfico, apesar de muitos alegarem que não fazia sentido não poderem votar, por exemplo, ao nível do plano orçamental. Não vejo nenhuma perda de poder nisso. Os presidentes de Câmara também não estão na Assembleia da República aquando da votação do Orçamento Geral do Estado. Desta forma, os presidentes de Junta, não ficariam reféns de qualquer “disciplina” de voto ou de colocarem em causa, em certos casos, a aprovação de um orçamento para um concelho de 50 mil habitantes, por causa de uma freguesia com 2 ou 3 mil habitantes. E a sua presença nas Assembleias Municipais sem poder de voto traria mais democracia ao órgão deliberativo do município pois há casos que os membros de cada bancada estão separados por um ou dois deputados e os presidentes de Junta vêm inquinar essa representatividade, no fundo, uma falsa representatividade. Outra mudança já muito falada por aí, e a meu ver correcta, é a da extinção, não de freguesias, conforme já referi, mas sim de Juntas de Freguesias, que são coisas distintas. E isso, no meu ponto de vista, poderia assentar em dois grandes critérios:

1 – Quando a população fosse diminuta, extinguia-se a eleição para a Assembleia de Freguesia, respeitando, porém, a obrigatoriedade de cada freguesia eleger um elemento para a representar na Assembleia Municipal. Outra das hipóteses seria, o agrupamento de freguesias mais pequenas, geridas por um só executivo, não perdendo as mesmas, as suas características, nomeadamente a nível de limites geográficos, entre outros. É o que se está a passar nas paróquias Católicas, neste caso por falta de padres.

2- Em zonas de média urbanidade, quando poderia ser a Câmara a executar as funções que numa freguesia compete à Junta. Que sentido faz, por exemplo, existirem freguesias nas sedes de Concelho. Porque que é que nestas freguesias, onde está implementada a sede do município, não cabe a um vereador a pasta dessa freguesia? As Juntas de Freguesia fazem sentido quando os locais são dispersos, maioritariamente rurais ou de características geográficas ou ambientais especificas. Ou no sentido inverso, quando as zonas urbanas atingem uma dimensão muito grande e, existindo Juntas de Freguesia, melhoram significativamente o apoio ao cidadão. Com esta reorganização, poupava-se mais e agilizavam-se recursos. E falando de extinções, algumas Câmaras poderiam seguir também o mesmo destino, ou seja, passarem a freguesias. Que sentido fazem, hoje, Concelhos com dois, três ou quatro mil habitantes? No século XIX foram extintos muitos municípios e isso não foi nada de mal, mas representou um ganho para as populações, no fundo, para o país.

 

Ex.mo Sr. Presidente da ANAFRE

Caros Congressistas

Também em termos de gestão e orçamento, se houvesse uma melhor clarificação na lei, ao nível das competências e da percentagem das verbas necessárias para o seu cumprimento, de certo que os presidentes de junta seriam mais autónomas, não precisariam de andar tantas vezes de mão estendida e responderiam melhor perante os seus eleitores na hora da eleição. E, se assim fosse, melhor se ajuizaria sobre a qualidade do presidente da junta. Não é tolerável que o discurso dos presidentes de junta continue a ser aquele que quando não há obra, a culpa é sempre das Câmaras. Com mais responsabilidade, também se apurava, quem eram, de facto, os melhores. Assim sendo, também as Câmaras ficariam mais libertas da realização de algumas obras nas freguesias e também da sua fiscalização. Sendo esse o caminho, o que tem que se discutir é a forma de transferência das respectivas verbas, os meios e o pessoal envolvido. Posto isto, e podendo a este nível, serem elencadas mais contribuições para a reforma administrativa das autarquias locais, não posso deixar de referir que outras mudanças se deveriam estender a outros patamares da administração do Estado.

É cada vez mais essencial a implementação das Regiões Administrativas e a extinção dos Governos Civis, que estão já desfasados das exigências do Século XXI e não passam, actualmente, de uma plataforma para distribuição de lugares políticos, para o Sr. Governador estar presente nas inaugurações ou para acompanhar a visita de um qualquer membro do Governo quando o mesmo se desloca ao distrito. Os presidentes de Junta têm, também, de ter uma palavra sobre este assunto. Mas voltando às freguesias e, além deste “limbo” em que se encontram os seus executivos e, sabendo eles ou alguns, desta realidade, estranho que a maioria se tenha acomodado e não faça pressão a quem de direito, não traga isto à discussão e não se unam. Melhorar a forma de gestão, aumentando a autonomia, traduzir-se-ia sem dúvida num melhor serviço às populações locais.

Ser presidente de Junta, não passa, a meu ver, só por exercer com estabilidade o seu mandato. Passa também por diagnosticar o que está mal e lutar por mudanças, lançando apelos e formando parcerias, pois “a união faz a força”. Não tenhamos medo de mexer a valer. Um Congresso destes, no século XXI, se não servir para darmos o salto para a actual modernidade, deixando muitas práticas do século XX, de nada vale, a não ser para manter, pretensamente, um poder fictício e distribuir lugares de destaque ou patrocinar influências à margem da Lei. Um bem-haja às freguesias… Viva o poder local…

Rui Luzes Cabral

Presidente da Junta de Freguesia de Loureiro, Concelho de Oliveira de Azeméis

Lisboa, 23 de Janeiro de 2010