Entrevista de Rui Luzes Cabral ao Jornal das Autarquias
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J.A.-Com o aumento do desemprego devido à crise que se gerou, estamos a assistir a um aumento de pobreza muito violento. Qual a vivência da autarquia com este novo fenómeno social?
P.J.-A autarquia loureirense tem neste mandato vindo a dotar a freguesia de um conjunto de mecanismos sociais que a tem reforçado nesta área e ajuda nestes tempos de crise. Logo em 2010 com a criação da Comissão Social de Freguesia que reúne com frequência e acompanha os casos mais carenciados, conseguimos juntar a autarquia, a paróquia e várias outras instituições a trabalharem todos juntos no apoio àqueles que mais precisam.
O primeiro grande trabalho desta comissão social foi a recuperação de uma casa pertencente à paróquia (oferecida pelo casal César Pinho e Maria da Silva Figueiredo – já falecidos) onde depois instalamos a Casa Social Maria da Silva Figueiredo onde todo o trabalho realizado é fruto do voluntariado. Neste casa social existe uma loja Solidária onde se distribuem alimentos, roupas, brinquedos e mobílias.
Mas além destes projectos em parceria com outras instituições, a Junta de Freguesia apoiou e encaminhou diversos casos durante o mandato para a Rede Social de Oliveira de Azeméis e dialogou com os mais diversos organismos que tutelam o apoio social em Portugal
Ainda durante este mandato que apanhou a crise em que vivemos, entregamos uma habitação a um casal que há muitos anos esperava da parte da Junta de Freguesia o cumprimento desta promessa.
Depois a um outro nível, aumentaram os pedidos de emprego na autarquia ou simplesmente o pedido de ajuda da Junta para interceder junto de empresas para conseguirem um trabalho. Sempre acompanhamos as pessoas nas suas dificuldades.

J.A- Qual a sua opinião sobre a proposta do governo para o futuro mapa judiciário?
P.J.-Nos anos setenta, oitenta e noventa do século passado, houve uma desconcentração do Estado, fazendo chegar a pequenas vilas e aldeias escolas básicas do segundo e terceiro ciclo, unidades de saúde, postos de polícia, estações de correios, repartições de finanças e muitos outros serviços do Estado que se queria perto das populações. A Justiça não fugiu a esta regra e foi a nível concelhio ganhando mais serviços e competências. Agora, e na maioria dos casos, por razões meramente económicas, os nossos governantes têm gerido os destinos do país muito sustentados pela folha de excel e isso, obviamente, tem levado novamente à concentração de muitos serviços do Estado, afastando as pessoas que já estavam habituadas a esses serviços sem nunca pensarem que essas conquistas poderiam desaparecer. É uma área um pouco distantes da gestão de uma Junta de Freguesia mas que pode criar alguns problemas sociais quando a justiça é lenta ou pouco actuante.

J.A.- Qual a sua opinião sobre as medidas que o governo pensa implementar após a decisão do Tribunal Constitucional, ao chumbar algumas leis?
P.J.-O problema português não é conjuntural como muitos gostam de defender, já tem séculos e tem sido alvo de muita discussão, antes por uma elite mais esclarecida, agora por um grupo maior de pessoas que vão notando as dificuldades em algumas áreas. E como diz o ditado, “em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão.” No fundo, falta-nos um ideia concreta para a sustentabilidade do país e recorremos muito a receitas que os “mercados” ou outras instituições internacionais nos vendem. Devido a isso temos retalhado ou destruído sectores chave do país como as pescas, a agricultura a industria metalomecânica, entre outras.
Por isso estas medidas serão o prato forte dos próximos tempos pois temos corrido atrás dos prejuízos de uma economia débil e pouco resistente às crises que de tempos a tempos nos atingem.
Nem nós nem o próprio governo sabemos o que precisa o país para o ano. Assim é difícil planear e governar. Temos que olhar com serenidade para um horizonte de 20 anos.

J.A.- Acha que estas medidas de austeridade resolvem o problema do país?
P.J.-As medidas de austeridade resolvem o problema dos “mercados”. E fazem-nos crer que a banca internacional e alguns países que lucram com tudo isto são o garante da nossa vida colectiva. No imediato talvez estejamos “amarrados” a este modus operandi e temos que aguentar, mas rapidamente devemos, enquanto pais soberano que somos, influenciar a política para que a política nos melhore a vida. E a Europa tem de acordar, só assim conseguiremos prosseguir com este sonho.

J.A.- Qual a vossa opinião sobre a emigração (forçada/aconselhada) dos nossos jovens, principalmente os mais credenciados?
P.J.-Quando temos vários responsáveis governativos a indicarem que esse poderá ser um caminho, está tudo explicado e percebemos logo quem nos governa. Baixar os braços não é a melhor solução. Todos sabemos que Portugal sempre teve um povo de vocação emigrante, agora que seja um membro do governo, que em período de aflição, pense que resolve os nossos problemas reduzindo a população, não há nada a dizer. Cada um de nós, deve é lutar para que Portugal seja um país melhor a cada dia que passa.

J.A.- Sendo uma grande parte da população com idade superior a 65 anos e, na maioria com reformas mínimas e sem qualquer apoio familiar, qual o apoio que essa autarquia presta a essa faixa etária?
P.J.-A autarquia está atenta aos casos mais problemáticos e apoia com alimentos, com encaminhamento para os apoios sociais e tem criado formas para os ocupar, através do desenvolvimento de programas desportivos e culturais estando em vias de criar um Clube Sénior para reforçar ainda mais esse apoio.

J.A.- Com o aumento de impostos e outras medidas tomadas pelo governo, quais as consequências poderão advir daí, na sua freguesia?
P.J.-As consequências poderão passar por mais dificuldades relacionadas com a alimentação, compra de medicamentos e mobilidade. Estremos atentos e ajudaremos sempre no que for preciso.

J.A.- Com a redução do parque escolar, como tem reagido a população a esta medida e quais as suas consequências?
P.J.-Na questão escolar a freguesia de Loureiro tem conseguido minimizar esses impactos e a população considera que, a este nível, agora as condições das crianças são melhores.

J.A.- Que medidas poderiam melhorar a educação no nosso país?
P.J.-Mais estabilidade do corpo docente, turmas até 20 alunos, aposta em algumas escolas profissionais de raiz, em áreas especificas, de acordo com as necessidades locais e uma ideia base comum a todos os partidos, independentemente dos governos e dos ministros. Mudanças constantes são um entrave à consolidação de um bom sistema de ensino.

J.A.- Com os problemas que têm surgido com o encerramento total ou parcial de Unidades de Saúde, como se encontra a vossa freguesia, nesta área?
P.J.-Nesta área mantivemos a nossa unidade de saúde, tendo sido reforçado inclusive o horário de abertura.

J.A.- Faça uma breve apresentação da freguesia, reportando-se à localização, extensão, número de habitantes, principais recursos económicos, entre outros?
P.J.-A freguesia de Loureiro, uma das dezanove freguesias do Concelho de Oliveira de Azeméis, dista cerca de 7 Km a sul, do concelho, 40 Km do Porto e 30 Km de Aveiro. Ocupando uma extensa planície de 17 Km2, nela se desenvolvem harmoniosamente variadas explorações agrícolas, comércio dinâmico e indústrias dos mais diversos ramos. Tem uma população de cerca de 3550 habitantes, de acordo com os censos 2011.
Em 1993, Loureiro comemorou o primeiro milenário da data do mais antigo documento que refere o seu nome. Diz esse texto, em pergaminho, que a 18 de Maio de 993 , um certo Godesteu vendeu a Gonçalo Fernandes e a sua mulher Ermesinda uma herdade que tinha na villa laurario, entre as vilas de Tonce e de Macieira, como troca de uma fiança que fez em nome de Querino, para que este saísse da cadeia onde estava a ferros. Tendo o mesmo Querino fugido às suas obrigações, Godesteu, responsável pela solvência da dívida, quis honrar a sua palavra, entregando a Gonçalo Fernandes a referida herdade que “lhe tocou entre irmãos e herdeiros”, compreendendo “terras rotas e não rotas (=arroteadas), árvores frutuosas e não frutuosas, pedras móveis e imóveis, águas de águas, sessegas (assentos) de moinhos, pastos, pauis, saídas, acessos a montes e regressos”.
Desta leitura resumida do documento, que consta do estudo que fez o erudito medievalista Dr Armando de Almeida Fernandes denominado “No Milenário de Loureiro (993 - 1993)", podemos concluir que Loureiro era uma terra muito mais antiga, com vida social intensa, podendo a sua primitiva Igreja ter sido uma das basílicas (Igrejas baptismais) da paróquia suévica (do século VI) designada por Insula (Ínsua), no território que tinha como cabeça o castro de Recarei (lugar do castro, S. Martinho da Gândara).
No princípio do século XI, habitaram a terra de Loureiro poderosas pessoas que aqui possuíam vastas herdades. No século XIV, uma família nobre, igualmente poderosa, descendente de Estêvão Peres, meirinho-mor de Aquém Douro, possuía o domínio do lugar de Tonce.
Segundo as inquirições de D. Dinis (1284 a 1288), o Rei D. Afonso III, seu pai, numa das visitas às Terras de Santa Maria esteve (“pousou”) em Loureiro para dar posse da Igreja ao Pároco de então, pelos serviços que lhe prestara, estando presentes Afonso Ribeiro e Martim Dias, “que eram herdeiros por parte das molheres e outros herdeiros”.
A Igreja actual, cuja construção data de 1925, substituiu a anterior de 1673, cuja capela-mor visigótica era, de acordo com a tradição, a antiga “capela” de São João. Administrativamente, a freguesia de São João pertenceu ao antiquíssimo Concelho de Bemposta, inicialmente da Comarca da Feira. Mais tarde da de Esgueira e, actualmente, na de Oliveira de Azeméis.
Território milenar, a ele está ligada a lenda das “Almas da Moura”, uma história simples e maravilhosa que se prende com a existência de uma grade de ouro encantada, à espera de ser desencantada por intrépidos loureirenses.
J.A.- Há quanto tempo está à frente dos destinos da junta de freguesia?
P.J.-Desde Novembro de 2009.

J.A.- Que balanço faz do trabalho desenvolvido enquanto presidente da junta?
P.J.-O balanço é muito positivo pois conseguimos desbloquear processos e obras que aguardavam há algum tempo. Desenvolvemos muito a área social, fomos parceiros com o município no reforço da oferta a nível de instalação de empresas que a Área de Acolhimento Empresarial vai proporcionar, negociamos bem a passagem do serviço dos CTT para gestão da Freguesia, houve reforço do horário na Unidade de Saúde, a sede do novo agrupamento de escolas é em Loureiro, não necessitamos de agregar a nenhuma freguesia, ou seja, todos dossiers positivos. Além disso construímos mais de 1km de valetas e passeios, alargamos vias, pavimentamos ruas, embelezamos jardins, reforçamos a cultura e o desporto, colocamos novas placas de toponímia, entre outras…

J.A.- Existe alguma lacuna na junta de freguesia que não lhe permite geri-la como pretendia?
P.J.-Temos cada vez mais falta de funcionários e um relacionamento com o município que necessitava de ser reforçado, não fossem as lógicas partidárias serem, ainda, em pleno século XXI um obstáculo a que se trabalhe em parceria plena. Mas há mais lacunas, por exemplo, falta-nos um parque de lazer, um circuito de caminhadas, uma casa cultural e pequeno arquivo histórico, a revitalização do Largo de Alumieira e instalação do mercado semanal em local condigno e condizente com as exigências da atualidade.

J.A.- Como é que esse concelho se encontra em termos de vias de comunicação?
P.J.-Um concelho bem situado a nível de vias estruturantes do país (A1, A25, A29, A32) mas com uma rede viária secundária e terciária muito degradada a precisar de uma intervenção de fundo.

J.A.- Além dos problemas acima mencionados, quais os que considera que necessitam de maior intervenção na freguesia?
P.J.-A questão da resolução do problema do mercado semanal e o arranjo urbanístico do Largo de Alumieira para dar à centralidade de Loureiro a modernidade que necessita para atrair mais comércio e chamar a este espaço as pessoas.

J.A.- Quais as perspetivas que tem para o futuro do freguesia?
P.J.-Uma freguesia de referência a sul do concelho de Oliveira de Azeméis que consiga conciliar a natureza, a agricultura, a industria, comércio e a oferta cultural. Onde as pessoas se sintam bem e que aqui possam viver com qualidade de vida.

J.A.- Qual o seu grande projeto para a autarquia?
P.J.-Além do que já foi falado da área de Acolhimento Empresarial, do arranjo urbanístico do Largo de Alumieira e da criação de um parque de lazer, há o grande sonho de se adquirir a casa que pertenceu a D. Frei Caetano Brandão (1740-1805), natural de Loureiro e que entre outras coisas foi Bispo de Belém do Pará e Arcebispo de Braga. Transformar essa casa numa casa de cultura, um espaço museológico e de memórias da freguesia.

J.A.- Como se encontra a situação financeira da autarquia?
P.J.-Encontra-se bem, temos realizado obras e actividades de proximidade e não temos nenhuma divida. O saldo é positivo.

J.A.- Qual o apoio que a autarquia recebe da câmara municipal e a que nível?
P.J.-Apoio financeiro mensal (cerca de três mil euros), protocolos esporádicos para a realização de algumas pavimentações e acordos para a ajuda na comparticipação das refeições escolares. Precisávamos de mais apoio de máquinas, materiais e meios humanos.

J.A.- Qual o envolvimento da população nos projetos da autarquia?
P.J.-Sempre que podem colaboram em algumas obras e aderem às actividades. Mas gostava que participassem mais na limpeza das valetas. Se cada um limpasse em frente a sua casa tínhamos uma vila mais limpa e bonita. Também um apoio mais consistente às associações da freguesia era importante.

J.A.- Considera pertinente a união ou extinção de algumas Juntas de Freguesia do concelho?
P.J.-Esta foi uma medida para dizer que se fez alguma coisa. O Governo não reorganizou o território, antes, extinguiu algumas freguesias sem critério e sem grande sustentabilidade cultural, social e a nível das infraestruturas que estão no território. Sou a favor de mudanças a este nível, desde que fosse algo bem estruturado, havendo mexidas também em alguns municípios e instituindo-se de vez as regiões administrativas. Um reforma de cima para baixo ao encontro das pessoas e não ao contrário.

J.A.- Quer deixar alguma mensagem aos cidadãos da sua freguesia?
P.J.-Que tenho estado ao serviço da freguesia. Desde pequeno, na paróquia, nas associações e agora na política para ajudar a minha terra a ser cada vez melhor. E a grande mensagem que deixo aos loureirenses é que vivam a freguesia, que se envolvam, que contribuam com qualquer coisa para o seu progresso. Só com o esforço de muitos é que poderemos ser uma freguesia agradável e interessante.

J.A.- Se alguma questão não lhe foi colocada e que queira destacar, esteja à vontade para o fazer.
P.J.-Quero só dizer que tem de haver mais competências para as freguesias. Já está comprovado que esta gestão de proximidade é muito eficaz e tem dado muitos resultados.

J.A.-Não querendo entrar na sua privacidade, e, sabendo nós, que a vida de autarca é bastante abrangente e nem sempre compreendida, onde fica a família no meio disto tudo?
P.J.-A família sofre muito com as nossas ausências mas na hora de fazerem o balanço compreendem que o sacrifício é por uma boa causa. No fundo, a família dos autarcas acaba por trabalhar indirectamente para o bem comum. É outro tipo de serviço, mas muito importante. E um autarca com uma situação familiar estável, no sentido de ser apoiado para o exercício das suas funções acaba por desempenhar melhor o cargo.

J.A.- Por último, gostaríamos que opinasse sobre o Jornal das Autarquias.
P.J.-Visito com alguma regularidade o Jornal das Autarquias pois presta um contributo importante para o conhecimento do que se vai fazendo a nível local neste país. É um serviço muito válido e que deve ser acarinhado pelos autarcas porque faz referência ao seu trabalho, às suas dificuldades e às suas expectativas.

Endereço da entrevista: http://www.jornaldasautarquias.pt/pages/Aveiro-Viseu/entrevista-pjf-loureiro.php